Transsexuais podem escolher em qual presídio cumprir pena

Para aprimorar os instrumentos que promovam e assegurem os direitos fundamentais de lésbicas, gays, bissexuais, transexuais, travestis ou intersexo (LGBTI) submetidas a processo penal, presas ou em cumprimento de penas alternativas ou monitoração eletrônica, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) aprovou ajustes na Resolução 348/2020.

O aprimoramento da norma foi aprovado por unanimidade no processo nº 0010207-87.2020.2.00.0000. Ela aperfeiçoa os mecanismos sobre o direito humano das pessoas LGBTI condenadas e privadas de liberdade e que possam cumprir suas penas em locais adequados ao seu gênero autodeclarado.

“A proposta é desenvolver instrumentos que promovam e assegurem os direitos fundamentais da população LGBTI submetida à persecução penal, encarcerada ou em cumprimento de alternativas penais ou monitoração eletrônica”, afirmou o conselheiro Mário Guerreiro, relator do processo.

O conselheiro destacou que, entre as alterações que a normativa traz, está o reconhecimento mais amplo à população transexual, seguindo o entendimento do ministro Luís Roberto Barroso (STF) na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 527.

“Diante da situação de assimetria informacional quanto às travestis, o STF deferiu parcialmente medida cautelar para determinar apenas que transexuais femininas sejam transferidas para presídios femininos”.

A resolução determina ainda que a decisão que determinar o local de privação de liberdade será proferida após questionamento da preferência da pessoa presa, a qualquer momento do processo penal ou execução da pena, assegurando ainda a possibilidade de alteração do local. Essa possibilidade deve ser informada expressamente à pessoa pertencente à população LGBTI no momento da autodeclaração.

No Brasil, apenas 3% das unidades prisionais (36 cadeias) possuem alas destinadas ao público LGBTI, segundo dados do Departamento Penitenciário Nacional (DEPEN). Outras 100 cadeias possuem celas exclusivas para essa comunidade. No geral, 90% das penitenciárias não possuem cela ou ala destinada a esse público.

Dignidade humana

A medida vai beneficiar principalmente a vida de mulheres trans, que sofrem graves situações de violência e discriminação dentro dos presídios masculinos. O direito à não discriminação e à proteção física e mental das pessoas LGBTI tem amparo no princípio da dignidade humana, no direito à não discriminação em razão da identidade de gênero ou em razão da orientação sexual, no direito à vida e à integridade física, no direito à saúde, na vedação à tortura e ao tratamento desumano ou cruel.

Além disso, a normativa está em conformidade com tratados internacionais ratificados pelo Brasil, com a legislação nacional relativa a Direitos Humanos e com a Constituição Federal. A norma segue a linha de proteção às minorias que o atual presidente do CNJ, ministro Luiz Fux, defende como fundamental para reduzir as violações de direitos que o Estado brasileiro ainda perpetua.

STF decide não julgar pedido sobre trans em presídios

O ministro André Mendonça, do Supremo Tribunal Federal (STF), desempatou o julgamento da ação que tratava do direito de pessoas transsexuais de escolher o presídio (masculino ou feminino) em que deverão cumprir pena de prisão. O julgamento estava em 5 a 5. Mendonça ampliou o placar no sentido de rejeitar o pedido por questões processuais.

O caso foi julgado no plenário virtual. O voto de Mendonça foi depositado na noite da segunda-feira (14), último dia da sessão de julgamentos aberta em 4 de agosto.

Para o ministro, depois de a Associação Brasileira de Gays, Lésbicas e Transsexuais ingressar com a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) sobre o assunto, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) editou resolução que resolve a contento a controvérsia.

“De fato, com a edição da Resolução CNJ nº 348, de 2020, posteriormente modificada pela Resolução CNJ nº 366, de 2021, operou-se, efetivamente, alteração substancial do panorama normativa descrito na inicial”, escreveu Mendonça, citando Lewandowski. 

No pedido, a associação requeria que o Supremo declarasse inconstitucionais normas do Poder Executivo que, segundo a entidade, favoreciam a violação de direitos fundamentais de pessoas trans. Desde o ingresso da petição inicial, no entanto, o Executivo e o Judiciário editaram estudos e normas dando ao encarcerado a opção de gênero para o cumprimento de pena em presídios. 

Pelas resoluções do CNJ, por exemplo, os juízes devem questionar a preferência do preso, se em presídio masculino ou feminino. A norma segue conclusões de estudos realizados pelo antigo Ministério das Mulheres, Família e Direitos Humanos, e também pelo Departamento Penitenciário Nacional (Depen), subordinado ao Ministério da Justiça e Segurança Pública.

Por esses estudos, o ambiente carcerário é extremamente hostil e discriminatório aos indivíduos transsexuais, que adotam diferentes estratégias de sobrevivência, como, por exemplo, o estabelecimento de relações amorosas, entre outras. Por esse motivo, o mais recomendado é questionar a presa ou preso sobre sua preferência. 

Entendimento jurídico

O relator do processo no Supremo, Luís Roberto Barroso, votou no sentido de que também o Supremo estabelecesse esse entendimento jurídico, além das normas já existentes. Ele foi acompanhado por Carmén Lúcia, Dias Toffoli, Rosa Weber e Edson Fachin. 

Essa corrente, contudo, ficou vencida pela divergência aberta por Lewandowski. Pela corrente vencedora o Supremo não pode mais aceitar a petição inicial, pois diante da evolução normativa não haveria mais interesse de agir para a ação. Além de Mendonça, seguiram esse entendimento Luiz Fux, Nunes Marques, Edson Fachin e Alexandre de Moraes. 

A ADPF sobre o tema começou a ser julgado em setembro de 2021, mas o placar, na época, ficou empatado em 5 a 5, diante da indefinição sobre a aprovação de André Mendonça para ocupar uma cadeira no Supremo. Somente agora o ministro depositou seu voto.




Fontes: CNJ/STF
Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

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