A Constituição Federal, em seu artigo 2º, diz que “são poderes da união, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário”. Porém, esse artigo constitucional precisa ser melhor analisando, pois as aparências das coisas enganam, assim como as palavras nem sempre apontam para a realidade das coisas.
Quando a Constituição diz que os poderes são independentes, ele quer dizer que os três devem funcionar sem interferência externa. Nem o Poder Judiciário pode atuar de acordo com os interesses políticos do Poder Executivo, nem o Poder Legislativo pode atuar sob pressão do Poder Judiciário. Ou seja, os três devem funcionar de forma que não se submetam à qualquer tipo de interferência ou pressão. Pelo contrário, devem exercer suas funções sempre com respeito mútuo e em defesa da democracia e do desenvolvimento do país.
Essa suposta independência voltou a ser questionada no mundo político e jurídico depois que o ministro do Supremo Tribunal Federal, Roberto Barroso, decidiu monocraticamente determinar ao Senado a imediata instalação da CPI da Covid-19, que visa apurar a responsabilidade ou não do presidente Jair Bolsonaro no combate à pandemia.
Não precisa ser um bacharel em direito para ver que esta é uma decisão de clara interferência de um poder no outro. A competência exclusiva de abrir ou não a CPI é do Senado Federal, de seu presidente e demais senadores, jamais de um membro do Judiciário.
Essa interferência compromete a democracia, a harmonia entre os poderes, além de provocar insegurança jurídica e embates políticos e jurídicos desnecessários. Não compete ao ministro mandar presidente de Senado fazer isso ou aquilo. A iniciativa é de ordem política, portanto, só cabe ao Legislativo decidir ou não pela abertura da CPI, e não ao Judiciário, mais precisamente o STF.
Será que o ministro gostaria que algum senador interferisse em suas decisões, mandando por exemplo, o Supremo colocar na pauta um caso que está à espera de julgamento há anos? Claro que não. A prerrogativa de determinar a data do julgamento é do presidente do STF e de seus pares.
Não somos contra o Senado instalar a CPI, é um direito que os senadores Alessandro Vieira e Jorge Kajuru, autores da ação no STF, possuem e devem exercê-lo livremente. Que façam a CPI se assim entenderem os senadores. Que apurem e punam o gestor em caso de comprovação de descaso dele para com a pandemia, mas essa é uma atribuição exclusiva dos senadores, não de ministro da Suprema Corte.
Se um juiz quer atuar politicamente que deixe a toga e se candidate, mas não queira usurpar poderes de outra instituição.
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