Pindorama: a terra indígena de Rugendas e Villa-Lobos recebeu o prêmio “Indigenous America Social, Political, Cultural Impact Award”.
Numa semana em que o cinema brasileiro colhe louros em Cannes, com Wagner Moura e Kleber Mendonça Filho no topo, com o filme “O agente secreto”, Sergipe também tem motivos para celebrar! O curta-metragem universitário “Pindorama: a terra indígena de Rugendas e Villa-Lobos” acaba de ser premiado com o “Indigenous America Social, Political, Cultural Impact Award” no prestigiado 15th Annual Latino & Native American Film Festival (LANAFF), nos Estados Unidos.
Criado pela estudante Shéron Morales, o curta faz parte de um projeto de monitoria sob coordenação do Professor João Liberato do Departamento de Música da Universidade Federal de Sergipe. “Pindorama” é um fotofilme que tece um diálogo sensível entre as marcantes imagens do pintor alemão Johann Rugendas, do século XIX, e a melodia rica e singular de “Uirapuru” de Heitor Villa-Lobos. Uma combinação que cruzou fronteiras e tocou o júri do festival americano.
“A alegria é indescritível!”, compartilhou Shéron, emocionada com a primeira participação internacional do curta.
“Foi nossa primeira participação em um festival de cinema fora do país, e que tem um foco social e educativo, princípios que norteiam a criação de Pindorama. Ele tem um objetivo didático e busca conduzir a uma reflexão sobre a situação dos povos indígenas no Brasil, ao mesmo tempo em que divulga a riqueza da nossa música erudita. Receber esse reconhecimento nos motiva muito a seguir adiante”, afirmou.
Em meio a mais de 2.600 filmes de todo o mundo, “Pindorama” se destacou entre os 420 exibidos, sendo agraciado por sua significativa contribuição social, política e cultural para os povos originários da América. O LANAFF, realizado pela Southern Connecticut State University, celebra em sua 15ª edição a diversidade cultural e histórica da América Latina e dos povos nativos americanos.
Carlos A. Torre, presidente da comissão organizadora do LANAFF, não poupou elogios.
“Parabenizamos calorosamente a equipe por essa conquista! É uma grande alegria saber que o curta está servindo como ferramenta educativa e de reflexão crítica sobre temas tão fundamentais como os povos originários e a cultura brasileira”, reconheceu.
Para o coordenador do projeto, João Liberato, a premiação é um reconhecimento do impacto da obra.
“A expectativa maior era cumprir os objetivos acadêmicos, fazer um trabalho com qualidade, interessante e significativo. A premiação foi o resultado natural dessa jornada. Ela representa a importância que esse filme teve para as pessoas, tocando em seus sentimentos em relação à história dos povos nativos”, comemorou.
Dos Livros Didáticos à Tela
A jornada de “Pindorama” começou de forma modesta, com a ideia de associar imagens históricas à música brasileira para a disciplina de História da Música no Brasil. Mas a visão de Shéron transformou o projeto inicial em um curta com uma narrativa potente, capaz de provocar reflexões sociais, políticas e culturais.
“O projeto com fotofilmes começou no período da pandemia de Covid-19, em 2021. Como eu não tinha experiência na área audiovisual, aproveitei e fiz vários cursos on line. O primeiro fotofilme que fiz foi “O Rio de Janeiro do século XIX – o RJ de José Maurício Nunes Garcia”. Ele não tinha um roteiro, não foi tão elaborado, pois estava iniciando. Mas, vi que poderia contribuir para levar para sala de aula temas que pudessem trazer reflexões no campo social, político, ambiental, econômico e cultural. Então, comecei a pensar em inserir uma narrativa, algo que pudesse conduzir os discentes de música licenciatura a uma reflexão sobre esses temas. E que fosse um produto que também pudesse contribuir na construção do saber fora das paredes da universidade. Ultrapassar o objetivo principal que era imergir no repertório musical brasileiro, através de imagens. Mas mergulhar em uma reflexão sobre essa história do passado e da atualidade”, detalhou Morales.
Inspirada pela sua ascendência indígena boliviana e pelas manifestações contra o Marco Temporal, além de um momento pessoal delicado, Shéron uniu a força das imagens de Rugendas com a beleza da música de Villa-Lobos para criar uma experiência audiovisual única.
“Pindorama é o terceiro fotofilme que fiz dentro do projeto de monitoria e ele traz inspiração da minha ascendência boliviana paterna inca e das manifestações contra o Marco Temporal ocorrido em 2022. Minha sensibilidade também estava mais apurada por problemas de saúde pelos quais estava passando. Isso tudo contribuiu na construção desse curta”, observou.
Um Olhar para o Futuro
Pindorama – a Terra indígena de Rugendas e Villa-Lobos (Direção: Shéron Morales e João Liberato) tem sido selecionado para ser exibido em diversos festivais de cinema (4°Cine Urutu; 18°Cineop; TV UFOP; Festival Internacional de Curtas de Guarulhos; 10° Festival Curtas Campos do Jordão; 2a. Mostra do Filme Independente em Ouro Preto/MG; 15a. LANAFF – Latino and Native American Film Festival). E o alcance de “Pindorama” já ultrapassa as telas, chegando a debates acadêmicos sobre a produção audiovisual indígena.
O resumo científico sobre o processo criativo deste curta foi selecionado e apresentado no dia 28 de maio no “Painel: Cinema, arte e educação” no “I Colóquio e Mostra Internacional Oca de Cinema Indígena”, uma ação de extensão promovida pela Universidade Federal da Bahia. Estavam presentes cineastas importantes, como Takumã Kuikuro. E a equipe não para por aí! Novos projetos já estão no horizonte.
“Um novo fotofilme já está em processo de criação. Tem como tema a presença da música nas imagens de Rugendas associadas à música da compositora Chiquinha Gonzaga, mulher negra, que tem destaque na história da música brasileira. Além disso, estamos com o projeto de extensão da UFS, com coordenação também do professor João Liberato, que vai criar fotofilmes com material do acervo do multiartista e cineasta baiano Chico Liberato, pioneiro na animação brasileira. Esperamos que o objetivo educacional e reflexivo também seja alcançado”, informou Shéron Morales.
Com a energia renovada pela premiação, a equipe de “Pindorama” segue trilhando o caminho da arte e da educação, mostrando que o cinema universitário sergipano tem muito a dizer e a emocionar. Uma bela notícia que ecoa pelos nossos sertões e ganha o mundo!
“Essa premiação é muito importante para o projeto, pois nos motiva a continuar. Vemos que o público está sendo alcançado e nos faz pensar que estamos no caminho certo e que podemos fazer ainda mais, pois ainda tem muito campo para atuar. Existe um material iconográfico vasto que as pessoas precisam conhecer e um repertório musical brasileiro que o público desconhece. O fotofilme acaba sendo uma forma dinâmica e atual para que esse conteúdo do passado alcance o público e leve a uma compreensão do presente, conduzindo a uma reflexão sobre o país que queremos”, destacou João Liberato.
Por Sheyla Morales
Foto: Divulgação
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