Precisamos reencontrar nossas próprias rotas em busca de um pacto “civilizatório” equitativo

Fardas e armas não retiram a dignidade, a seriedade e a integridade das pessoas, tampouco asseguram automaticamente esses atributos a quem os usa;Bandido bom é bandido investigado, julgado e se culpado punido. Feitas essas ressalvas, vamos a alguns exemplos:Um cidadão do interior do estado de Sergipe, pai de uma criança de 7 anos, estudante de direito, com emprego e endereço fixos, investigado como suspeito de homicídio, sem antecedentes criminais foi torturado e morto dentro de casa mesmo algemado e já rendido.

A ação da polícia Rodoviária Federal no dia 26 de maio com um homem de 38 anos com problemas psiquiátricos foi truculenta, burra e sem critérios. Ele foi seviciado e morto sob olhares de terceiros e com uma filmagem deplorável onde é possível vê-lo perguntar o que tinha feito para ser abordado daquela maneira. O que podemos tirar desses dois exemplos?Ainda que parte da policia responda que boa parte da sociedade pensa assim, precisamos denunciar a necropolitica do Estado brasileiro que trata preto, pobre, LGBTQIA+, sem sobrenome e/ou sem pistolão como violável e matável. Um político acusado de envolvimento com milícias e peculato não é abordado de forma truculenta, mas um suspeito sem “bons amigos no poder” é morto sem direito à defesa.

Precisamos parar de naturalizar o abuso do poder (armado ou não). Farda não dá integridade automática, pelo contrário, dá mais responsabilidade. Quem ainda se sente protegido pela polícia? Quem nunca viu uma cena de ação policial que considerou desmedida ou da qual desconfiou de excessos por conta de certos procedimentos? Como a polícia age no Bairro Jardins e como age no conjunto Jardim?O debate civilizatório não pode ser um debate de criminalização da polícia, mas jamais pode ser esquecido em detrimento da naturalização da eliminação de indivíduos mais vulnerabilizados.

Uma polícia confiável precisa estar menos pronta apenas para a guerra e mais pronta para a defesa social.Basta dessa política implícita de higienização social que premia quem rouba a granja e mata ou prende quem rouba a galinha.Há uma canção dos anos 90 da banda Biquíni Cavadão chamada “Zé Ninguém”. Sua letra diz “aqui embaixo as leis são diferentes”. Todos querem a promoção da justiça social, dignidade para viver e até o televisivo combate à corrupção.Reencontrar o caminho da civilização no país passa por além de derrotar esse governo bárbaro, retomar a construção de forças de seguranças que antes de tudo deem às nossas populações socialmente vulneráveis apoio e segurança e não medo e humilhação. 

Poderíamos pedir minutos de silêncio pelas centenas de mortes arbitrárias perpetradas pelo Estado brasileiro, mas não convém. Mesmo com as lágrimas de suas famílias, lutar tem que vir com o luto. São os silêncios que mantém as Injustiças. Por um Brasil onde a condição social não mate nem pela fome nem pela precariedade de nossa cidadania. 


Francisco Emanuel Silva Meneses Alves é cientista social, analista político, professor e membro da Academia Capelense de Letras e Artes.

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