O que não te contaram sobre o fim das coligações proporcionais

Em tempos mais recuados, Charles Darwin, ao pautar sua teoria evolutiva humana na Lei da Seleção Natural, alertou que “na luta pela sobrevivência, os mais aptos ganham à custa de seus rivais, porque conseguem se adaptar melhor ao seu entorno”. Tal premissa encaixa-se, como uma luva, ao contexto das Eleições Municipais 2020.

Todo ano eleitoral é sempre um desafio para pré-candidatos, candidatos, dirigentes partidários e agremiações políticas como um todo. Isso porque, as inovações legislativas em matéria eleitoral são constantes e, por vezes, reestruturam significativamente a forma de fazer política. Não por outra razão, tais atores (principalmente eles), devem buscar atualização e capacitação contínuas, afinal, já não há mais espaço para amadorismo. A velha política está, gradativamente e por questões óbvias, sendo ultrapassada.

Nesse contexto, especificamente no que diz respeito ao fim das coligações proporcionais, implementado através da EC nº 97/17, além de objetivar reduzir a fragmentação partidária, impedir o nefasto “Efeito Tiririca” e o desvirtuamento ideológico do voto (na medida em que o voto do eleitor, atribuído a determinado candidato, poderia beneficiar outros nomes cuja bandeira, não raras vezes, era totalmente antagônica), trará diversos desafios e obstáculos aos players antes, durante e após o processo democrático eleitoral.

Primeiramente, é importante destacar que o número de candidatos a serem lançados pelo partido, individualmente, para concorrerem no prélio municipal, não poderá exceder a 150% do número de vagas da respectiva Casa Legislativa (se há 10 vagas, cada partido pode registrar até 15 candidatos). Isso contribuirá para o aumento do número de candidatos, na medida em que antes, toda a coligação poderia lançar até 200% da quantidade de cadeiras a serem ocupadas (se 12 partidos se unissem em 3 coligações para disputarem as vagas de uma Câmara com 10 vagas, teríamos o total de até 45 candidatos. Agora, esses mesmo 12 partidos, registrando, sozinhos, o máximo permitido, teremos o total de 180 candidatos).

Daí decorre o “x” da questão. Pelo fato de ter a obrigação legal de concorrer sozinho, o partido, através dos seus dirigentes, terá de cuidar em “encontrar” candidatos que tenham chances reais e efetivas de se elegerem ou, ao menos, obterem votações expressivas, sob pena de não atingir o quociente eleitoral (barreira de caráter eliminatória) e, consequentemente, não ter representantes eleitos para a Câmara de Vereadores. Isso demanda a busca pelo fortalecimento da ideologia da agremiação, o desenvolvimento estrutural e pessoal, com assessorias técnicas capacitadas, estudo detalhado de estratégias para alcance do quociente eleitoral e, sobretudo, a articulação prévia com os interessados em submeter o seu nome ao voto popular.

Também como efeito lógico do fim das coligações, aqui reputado como um dos pontos mais cruciais e que demandam atenção especial, estão a famosa “cota gênero” e a famigerada “candidatura laranja”. Costumeiramente, os partidos, até as Eleições Municipais de 2016, registravam (por vezes, às pressas), candidaturas fictícias, somente para fins de atendimento do mínimo legal exigido de cada gênero (30%). Quando da abertura das urnas, esses (as) candidatos (as) alcançavam somente um, dois votos ou, até mesmo, nenhum (pasmem: nem o próprio voto o candidato conseguia obter).

Em 2020, tal prática, além de caracterizar tolice dos dirigentes partidários (com a devida escusa), na medida em que colocará em xeque o alcance do quociente eleitoral, representa um risco para toda a chapa registrada pelo partido, notadamente porque o Demonstrativo de Regularidade de Atos Partidários (DRAP), apresentado pela agremiação à Justiça Eleitoral com o rol de todos os candidatos registrados, estará eivado de ilegalidade, vindo a ser derrubado. Situação idêntica aconteceu recentemente (17/09/2019), onde o TSE, ao julgar o REsp nº 19.392/PI, cassou o mandato de 6 vereadores eleitos na cidade de Valença do Piauí/PI, tornando-os inelegíveis, vez que na chapa que integravam, restou constatada a presença de candidaturas laranjas, em nítido intuito de fraudar a legislação eleitoral.

Diante desse panorama, tenho dito que um dos grandes desafios do candidato em tempos atuais não é eleger-se, mas assegurar o mandato pelo prazo constitucional, afinal, os órgãos de controle estão assumindo um protagonismo cada vez maior, gerando, muitas das vezes, a “judicialização da política”, para, quiçá, “politizar a justiça” ou os seus personagens, razão pela qual deverá aquele, além de escolher a legenda mais propícia e preocupar-se com a sua campanha, fiscalizar os atos do partido.

Por fim, é importante registrar que, de forma lamentável, as Eleições Municipais, novamente, estão sendo utilizadas como uma espécie de cobaia às Eleições Gerais: “vamos testar o pleito sem coligações, se não der certo ou não for benéfica aos nossos interesses, alteramos para 2022”. Não entendeu? Pesquise no “Dr. Google” sobre a PEC nº 67/2019, em trâmite no Congresso Nacional.

Avante, amigos!!


Osmário Araújo Filho é professor e advogado especialista em Direito Eleitoral pela PUC/MG.

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