O alvo errado no investimento educacional de Aracaju

Com mais de 30 anos de experiência como profissional de informática e graduado em Ciência da Computação pela UFS, sempre acreditei no poder transformador da tecnologia na educação. O uso de plataformas como o Google Education, amplamente adotadas por escolas particulares, deveria ser mais presente nas escolas públicas, onde há uma evidente carência tecnológica.

Surpreendentemente, ao investigar o processo licitatório 102/2023 da Secretaria Municipal de Educação, destinado à compra de notebooks e implantação do Google Workspace, deparei-me com um custo exorbitante de R$ 143 milhões. Para um projeto que poderia modernizar a educação pública, o valor parece desproporcional. Isso levanta uma questão: estamos investindo de maneira eficiente?

O edital prevê a compra de 50 mil notebooks, o que já é um número que gera dúvidas. De acordo com o Censo Escolar 2024, Aracaju tem menos de 20 mil alunos matriculados no ensino municipal e 2.500 professores ativos. Mesmo considerando todos esses usuários, os números não batem. Para quê adquirir tantos dispositivos? Além disso, as vagas ofertadas pela prefeitura em 2024 foram 9.800, tornando essa matemática ainda mais confusa.

Outro ponto técnico intrigante é a escolha de notebooks, em vez de Chromebooks, que são o padrão mundial para uso do Google Workspace. O modelo de notebook escolhido, Daten DCM3D-1, custa R$ 2.390,00 por unidade. Comparado a um Chromebook, que custa em média R$ 1.400,00 no varejo e ainda menos em compras em grande volume, fica evidente que a escolha não é financeiramente vantajosa. Os Chromebooks também têm uma vida útil mais longa, de até 8 anos, e são mais resistentes, especialmente em ambientes escolares, onde a durabilidade é essencial.

Outro ponto crítico é o custo de treinamento contínuo incluído na licitação. Com um valor de R$ 299 por aluno, ao mês, por três anos, chega-se ao montante de quase R$ 15 milhões apenas para essa parte do projeto. Além disso, há R$ 1,5 milhões destinados ao treinamento de gestores e R$ 333 mil para formar 10 técnicos de TI. Mais alarmante ainda é a contratação do aplicativo de gerenciamento Bluedu, ao custo de R$ 7,6 milhões, sendo que ferramentas gratuitas, como o Veyon Classroom Orchestrator, poderiam fazer o mesmo trabalho sem onerar os cofres públicos.

Para colocar essa situação em perspectiva, o governo do Paraná implantou o Google for Education para 1 milhão de alunos em 2021, com um custo total de R$ 30 milhões. Comparativamente, o custo por aluno em Aracaju é 95 vezes maior. Aplicando essa lógica à nossa realidade, o valor por usuário no Paraná foi de R$ 30, enquanto em Aracaju chega a impressionantes R$ 2.866,00 por aluno. Isso considerando aquele número de 50.000 usuários.

Se há boa fé por parte dos responsáveis, o que resta claro é a falta de competência técnica e administrativa nesse processo. Estamos falando de recursos públicos, pagos pelo contribuinte aracajuano, e decisões como essa exigem uma reflexão urgente. A eficiência e a transparência devem ser prioridades quando o objetivo é melhorar a educação de nossas crianças.


Aurélio Lima Barreto é analista de sistemas graduado pela Universidade Federal de Sergipe e articulista colaborador do Hora News.

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