“Deixo a presidência do SINDIJOR com a sensação do dever cumprido”, diz Paulo Sousa

O jornalista Paulo Sousa, que deixará a presidência do Sindicato dos Jornalistas de Sergipe (SINDIJOR), em setembro, faz um balanço positivo da sua gestão, critica duramente o presidente Jair Bolsonaro e explica sua preocupação com as redes sociais e as falsas notícias que são ventiladas.

“As redes sociais em que todo mundo dá uma de jornalista, escreve qualquer coisa e de certa forma acaba comprometendo o trabalho profissional do jornalista, por que muitas vezes a sociedade confunde o que se publica, amadoramente, nessas redes com conteúdo jornalístico. É por isso que a sociedade deve separar o joio do trigo, saber o que Jornalismo e o que não é. Jornalismo é tudo que é produzido, após pesquisa, investigação e apuração feita pelos jornalistas, profissionais formados, capacitados, qualificados para lidar com a notícia. Já o resto quando não é amadorismo, é fake news”, diz Paulo Sousa.

O senhor não foi candidato à reeleição de presidente do Sindicato dos Jornalistas de Sergipe, nas eleições que aconteceram esta semana e confirmaram, em chapa única, o jornalista Edmílson Brito como novo presidente. Como encontrou o sindicato e como está deixando?

Exatamente. Após dois mandatos, totalizando seis anos na administração do Sindicato, o deixo numa situação excelente, podemos afirmar assim, sem nenhuma vaidade, até por que quem me conhece sabe da minha sinceridade. O novo presidente encontrará um sindicato com sede própria, climatizada, com auditório, confortável e bem localizada. A nova gestão também encontrará um sindicato muito bem organizado em matéria de finanças. Além de estarmos deixando a entidade com as contas em dia, inclusive superavitárias, os jornalistas terão uma opção a mais para pagar sua mensalidade ou anuidade por meio de uma máquina de débito e crédito, que vai facilitar a vida dos associados que não têm o desconto em folha. Também a nova diretoria encontrará um sindicato com uma secretária contratada, que é uma funcionária responsável por cuidar da parte administrativa da entidade, além de um advogado, responsável pela assessoria jurídica ao sindicato e aos jornalistas filiados. Portanto, deixo a presidência de cabeça erguida com a certeza do dever cumprido.

O que foi fundamental para se conseguir avanços numa época de crise?

Primeiro, dialogando com os jornalistas e mostrando para eles que sem a união e participação de todos não teríamos como avançar, que a participação de cada um é imprescindível para o fortalecimento do sindicato e, automaticamente da classe, para que assim consigamos ter forças para reivindicar dos patrões medidas que melhorem a vida de todos nós. O segundo passo, foi a criação de uma linha de diálogo respeitoso para com as empresas de comunicação, mostrando a importância que elas têm para os trabalhadores da comunicação, especialmente do campo jornalístico, mas também mostrando aos patrões a importância que tem o jornalista para o sucesso da empresa. Sem o jornalista não há informação, não há notícia. Essa maneira respeitosa de se dialogar avançou, adquirimos mais respeito perante a classe empresarial, mas principalmente a categoria e a própria sociedade, que enxerga nos jornalistas uma categoria indispensável para a democracia e a liberdade de expressão. Sem jornalista não há democracia, sem jornalista não há liberdade de expressão.

Como nem tudo são flores, o sindicato não conseguiu persuadir os empresários do meio de comunicação e garantir um piso salarial que espelhe a importância dos jornalistas. Sergipe paga um dos mais baixos pisos do Brasil. É impossível fazer o empresário sergipano enxergar o valor do jornalista?

Verdade, Joedson. O nosso piso já chegou a ser o menor do país, mas graças ao engajamento da classe, da determinação e da luta da nossa diretoria, da qual você faz parte e muito contribuiu com os avanços, tiramos o nosso estado deste mapa vergonhoso, mas mesmo assim ainda somos um dos menores pisos da federação. Porém, é importante salientar que desde quando assumimos a direção do sindicato, em setembro de 2013, nossos reajustes sempre foram acima da inflação, ou seja, reajuste com ganho real. Isso fez com que nosso piso melhorasse e se distanciasse das últimas posições. Mas para alcançarmos o piso desejado, precisamos fortalecer ainda mais a nossa luta junto a classe patronal.

Jornalistas de Alagoas fizeram uma greve, recentemente, e conseguiram êxito no pleito. É a única linguagem que o empresário entende?

Na maioria das vezes os patrões só entendem na base da pressão, mobilizações e ações judiciais, que foi o que ocorreu com uma televisão que teve que indenizar um grupo de jornalistas em quase R$ 100 mil. Precisou o SINDIJOR acionar a Justiça para o patrão entender a nossa linguagem. A greve deve ser um instrumento a ser usado em último caso, mas acho até que estamos caminhando para esta direção, diante as perseguições e ataques que o movimento sindical vem sofrendo ultimamente pelo atual e pelo ex-governo, e o movimento sindical do Jornalismo brasileiro também está sendo atingido por esta política de desvalorização do trabalhador e tentativa de desmonte do sindicalismo. Mas é preciso antes mobilizar a categoria, conscientizá-la da importância que tem um movimento grevista. E o sindicato patronal em Sergipe já dá sinais que quer retirar direitos conquistados pelos jornalistas em décadas de luta. Nós não aceitaremos nenhum retrocesso e caso seja necessário a greve se fará indispensável.

Por outro lado, com greve, corre-se o risco de haver demissões, como aconteceram após a própria greve alagoana. Alguns jornalistas precisam perder seus empregos, para que a categoria obtenha ganhos? É o alto preço a ser pago?

Infelizmente essa uma possibilidade real, daí o motivo de muitas vezes se ter dificuldade em aprovar uma greve na própria diretoria. E nessas horas o sindicato tem que avaliar as consequências de uma greve para os profissionais que aderirem, ou seja, a diretoria tem que agir pela razão e não no calor da emoção. Se você perguntar se eu já tive vontade de fazer uma greve, eu diria que sim, mas nem sempre as coisas são como a gente quer. É preciso ter responsabilidade com a classe, cautela, até mesmo por experiencias que já tivemos no passado. Mas acredito que no caso de Alagoas eles só anteciparam o que já estava no radar deles.

Cada vez mais, as redações contratam menos jornalistas, sobretudo os jornais impressos. Como o jornalista lida com essa nova e preocupante realidade?

Essa é uma realidade mundial. A tendência é que os jornais impressos aos poucos migrem totalmente para o digital. Essa mudança, até certo ponto, não prevista, causa um desconforto para os jornalistas, um receio e até mesmo uma frustração pela importância que teve e ainda tem o jornalismo impresso. Mas aos poucos os colegas vão se adaptando a esta nova realidade. O ruim não é o advento do webjornalismo, mas a pouca mão de obra que estes veículos absorvem em comparação com o impresso. Porém, o que mais nos preocupa não é essa mudança, até por que a comunicação nesses veículos continuará sendo feita por jornalistas profissionais, mas sim as redes sociais em que todo mundo dá uma de jornalista, escreve qualquer coisa e de certa forma acaba comprometendo o trabalho profissional do jornalista, por que muitas vezes a sociedade confunde o que se publica, amadoramente, nessas redes com conteúdo jornalístico. É por isso que a sociedade deve separar o joio do trigo, saber o que Jornalismo e o que não é. Jornalismo é tudo que é produzido, após pesquisa, investigação e apuração feita pelos jornalistas, profissionais formados, capacitados, qualificados para lidar com a notícia. Já o resto quando não é amadorismo, é fake news.

Qual o peso das redes sociais nesta crise que ronda os empregos em redações dos veículos de comunicação, já que, hoje, qualquer pessoa dá a notícia em uma rede social?

Como disse anteriormente, as redes sociais acabam, até certo ponto, comprometendo o trabalho do jornalista na medida em que a sociedade não consegui distinguir o que é Jornalismo e o que não é Jornalismo numa rede social. Mas cabe a cada um de nós fazer chegar à sociedade essa diferença. Mas aos poucos a própria sociedade vai percebendo que rede social é lugar apenas de se relacionar, fazer amizades, mas não de buscar informação. Os veículos profissionais na Internet – sites e portais de notícias, por exemplo, são a fonte de notícia em que sociedade acredita, dar credibilidade. As redes sociais ameaçam, mas não substituirão o papel dos veículos de imprensa. E seguindo uma ideia deste colega que me entrevista, oriento os jornalistas a não publicarem a matéria completa nas redes sociais, mas apenas inserir o link para o veículo de imprensa que a produziu. Assim, você valoriza a produção jornalística e evita que a rede social tenha mais importância que o veículo de imprensa.

O jornalista quando usa informações (texto, fotos, imagens) produzidas por quem não é jornalista em um veículo de comunicação não dá um tiro no próprio pé?

Além de um tiro no pé ele está contribuindo para a desvalorização da profissão. Quem garante que aquele texto, foto ou imagem reproduzem a verdade? Quando o jornalista reproduz um material desse ele chama pra si toda a responsabilidade, inclusive jurídica. O jornalista não deve, em hipótese alguma, repassar suas atribuições para quem não tem formação em Jornalismo. Além de ser uma transgressão ao Código de Ética dos Jornalistas, é uma falta de respeito à sociedade, que terá um material de conteúdo duvidoso, já que não foi produzido por um jornalista.

Por outro lado, há como fugir desta nova cultura no exercício de uma profissão cuja essência é o novo? A notícia em primeira mão?

Já diz o ditado que quem é apressado come cru (rs). Por isso, o jornalista deve se preocupar é com o bom Jornalismo e não se esse veículo de imprensa será o primeiro a divulgar. Devemos nos preocupar primeiro é com a apuração, a checagem das informações, para que esta notícia chega ao consumidor (leitor, ouvinte e telespectador) com o máximo de confiança e credibilidade possível.

Recentemente, o deputado estadual Rodrigo Valadares foi acusado de fazer uso de notícia falsa para atingir a gestão do prefeito Edvaldo Nogueira. O parlamentar admitiu que recebeu o vídeo e repassou. Obviamente, não checou a voracidade da informação. Como o senhor avalia este episódio?

Bom, felizmente que o episódio não envolve jornalista. É uma prova do quanto é importante e indispensável o papel do profissional de imprensa. Se o deputado tivesse se preocupado em checar a informação audiovisual, por exemplo, pesquisando se tal informação foi divulgada por algum veículo profissional de imprensa, certamente não cairia nessa armadilha. No mínimo, servirá de lição.

Qual a expectativa do Sindicato dos Jornalistas no tocante à reforma da Previdência aprovada pela Câmara Federal?

Pelo que temos acompanhado pela imprensa independente, mas principalmente pelos diretores da FENAJ, em Brasília, é uma medida que tornará a vida do trabalhador mais difícil na hora de se aposentar. Eu diria que é um retrocesso, pois penaliza os mais pobres, pessoas que já ganham muito pouco terão que contribuir por muito mais tempo. E lamentamos que boa parte da imprensa tradicional não reporte a verdade sobre a reforma. Observe que essa mídia só apresenta a opinião dos que são favoráveis, mas não permite o contraditório, ou seja, ouvir também os contrários à reforma. Em resumo, ela sacrifica ainda mais a vida dos pobres e eleva a riqueza da elite brasileira, em especial os banqueiros, que são os que mais lucram com esta reforma.

E quanto ao governo Jair Bolsonaro, qual a sua avaliação destes primeiros seis meses?

Até o momento a pior possível. Mas o que esperar de um candidato despreparado, desqualificado para o cargo? Um presidente arrogante, racista, homofóbico, preconceituoso e amante da ditadura? Um governante que persegue a imprensa, as universidades e os sindicatos não tem como obter avaliação positiva. O que esperar de um presidente que prometeu ser diferente dos outros, em matéria de moralidade pública, principalmente, e na prática faz tudo igual? Deixo que todos reflitam se valeu a pena se deixar conduzir pelo discurso do ódio e da intolerância e colocar no comando da nação um cidadão com todas essas características.


Por Joedson Telles/Universo Político
Matéria reproduzida do site Universo Político

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