O novo mecanismo para financiamento do SUS possibilitado pela EC 86/2015, por meio das emendas parlamentares, trouxe para a Gestão do SUS um novo ator: os parlamentares. Existe uma tensão inerente ao caráter das emendas, como recurso político e mecanismo financeiro. Em ambas as faces o que deve estar em mente é a garantia do Direito a Saúde, por meio do financiamento das ações ofertadas pelo SUS. Volumes expressivos, direcionados por meio das emendas parlamentares, são destinados aos entes subnacionais (Estados e Municípios). Estes repasses ocorrem por meio das transferências do Fundo Nacional de Saúde para os fundos dos demais entes subnacionais para o financiamento das Ações e Serviços Públicos de Saúde ( ASPS). A questão é que muitas destas indicações ocorrem sem que sejam consideradas as necessidades locais, a capacidade instalada e a rede de atenção das regiões de saúde. As emendas deveriam ser uma intensa fonte de investimento da União no SUS, desde que gerenciadas de forma a atender a política de modernização e ampliação da infraestrutura para a melhoria na qualidade da assistência e da vida das pessoas, de responsabilidade do Ministério da Saúde. Todavia, a indicação do ente recebedor fica a cargo do parlamentar.
Conceitualmente, as emendas foram criadas para trazer maior balanceamento entre os Poderes. No entanto, as variadas lógicas de distribuição resultaram em uma destinação per capita desigual entre as regiões do país e, fatalmente, desconexa ao planejamento de saúde dos gestores do SUS.
Em análise per capita é observado que as distribuições são díspares. A diversidade de alocação per capita em municípios com população similar, demonstra que o planejamento e organização do serviço possa estar comprometido, notadamente nos municípios com menor população.
Vejamos um exemplo, em 2021 a cidade de Maceió/AL com uma população de 1.025.360 habitantes recebeu de emendas um valor per capita de 146,01 R$. São Luiz/MA tendo uma população similar com 1.108.975 habitantes, recebeu um valor per capita de 42,93 R$. o município de Serra da Saudade/MG com 776 habitantes recebeu per capita um valor de 579,90 R$. O município de Bora/SP com 838 habitantes recebeu um valor per capita de 54,73 R$
Registra-se que os recursos possibilitados pelas emendas parlamentares têm sua importância no cumprimento das despesas originárias da gestão local, mas não se transformaram em recursos adicionais para financiamento do SUS, apenas representam a manutenção da redução do gasto Federal na composição do gasto público aos longos dos anos. Frente a garantia do Direito a Saúde previsto na Constituição Federal, o (sub)financiamento histórico do SUS, somando as dificuldades estruturais, institucionais e da própria gestão, as emendas parlamentares acirram interesses, e reforçam práticas que promovem a desigualdade de alocação dos já escassos recursos destinados às Ações dos Serviços Públicos de Saúde(ASPS).
A ação conjugada entre os Poderes é necessária, com competências melhor definidas a fim de que o Estado, por meio do seu orçamento, possa cumprir seu papel de executar as escolhas da população sobre a aplicação dos recursos públicos e desta forma garantir o direito fundamental a saúde disciplinada no texto constitucional brasileiro.
Recomendamos intensificar os esforços e aperfeiçoar as relações entre os Poderes, trabalhar o combate ao individualismo institucional para criar mecanismos mais eficientes de alocação desses recursos, para melhor atender as necessidades de saúde da população.
Emanuelly Carvalho Hora é enfermeira, palestrante, gestora do Sistema Único de Saúde (SUS) e articulista do Hora News.
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